Custo da habitação em Lisboa

Lisboa é a terceira cidade onde é mais caro viver, tendo em conta os rendimentos médios quando comparados com o custo da habitação e com o custo de vida, segundo um recente estudo da seguradora inglesa “CIA Insurance”. Que futuro se perspectiva para Lisboa, quando os salários portugueses nos empurram para as periferias?

“Lisboa é a terceira cidade mais cara do mundo para se viver”.

Fonte: Idealista, com base no estudo “”The cost of living crisis: How big is the gap between outgoings and incomings around the world?”

O estudo da “CIA Insurance”

O estudo da seguradora inglesa “CIA Insurance” teve como objectivo a comparação entre 56 grandes cidades, no que respeita a relação entre rendimentos, custo de vida e custo da habitação. Trata-se de um estudo interessante, uma vez que a simples análise dos valores da habitação pouco ou nada nos dizem acerca da facilidade no acesso à mesma.

Critérios usados no estudo

No custo de vida são consideradas despesas com transportes, alimentação, água, eletricidade e lazer e para o custo da habitação foi usado o valor médio da renda de um apartamento T3.

As três cidades do mundo mais caras para se viver

De acordo com o estudo acima referido, as três cidades mais caras do mundo para se viver são, por esta ordem: Roma, Londres e Lisboa. No pólo oposto está Berna, na Suiça, onde os custo da habitação e o custo de vida (apesar de elevados) são largamente compensados pelos elevados rendimentos médios.

O custo da habitação em Lisboa e o rendimento médio disponível

No estudo chega-se à conclusão que o rendimento médio disponível em Lisboa é de -1150 euros (salário médio de 1.037 euros subtraído do valor médio de 1.626 euros pela renda de um T3 e dos 561 euros do custo de vida). Ora, tal significa que os salários médios nacionais não permitem viver em Lisboa, a menos que se disponha de poupanças ou outros rendimentos para além do trabalho.

Os principais problemas causados pelo desfasamento de salários face aos custos da habitação

Com base nas conclusões do estudo, nomeadamente no desfasamento entre salários médios e custo da habitação, exponho abaixo os meus pontos de vista enquanto perita avaliadora de imóveis, no que respeita a esta problemática na cidade de Lisboa.

A procura pela periferia e as suas consequências

As consequências deste desiquilíbrio entre os salários médios e o custo da habitação em Lisboa estão já à vista: a impossibilidade de aquisição ou arrendamento em Lisboa por parte de grande parte dos cidadãos, que se vêm obrigados a viver nas periferias. Esta situação traz várias consequências económicas e sociais. Sendo que a maioria dos empregos se concentra em zonas centrais, o facto das pessoas viverem na periferia implica a necessidade de maiores deslocações, com prejuízo do tempo para a família e lazer. Em termos ambientais, há que ter em consideração as emissões provocadas por essas mesmas deslocações, factor que tem especial relevância numa época em que tomámos consciência da urgência na despoluição global.

O sobre-endividamento

Por outro lado, muitos são os que insistem em manter-se em Lisboa, nem que isso signifique um maior esforço financeiro (muitas vezes incomportável), o que pode levar a um aumento de casos de sobre-endividamento. Para além do risco de incumprimento bancário, o aumentos dos casos de sobre-endividamento tem repercussões em toda a economia, uma vez que as pessoas deixam de ter rendimento disponível para gastos não essenciais.

A gentrificação

Há ainda o fenómeno da “gentrificação”. Trata-se da perda de identidade cultural e social de um espaço, que afecta habitualmente locais carismáticos e diferenciados, quando os habitantes locais deixam de ter capacidade de suportar o custo da habitação e se vêem obrigados a abandonarem as suas casas e/ou negócios. Aos poucos, as características únicas que diferenciavam aquele espaço dos demais, e que consequentemente o valorizavam, acabam por se perder. As experiências tradicionais mostradas aos turistas não passam de encenações e os bairros típicos tendem a transformar-se em parques temáticos. Esta problemática que afectou outras cidades europeias, como Barcelona, é hoje uma forte ameaça à identidade da cidade de Lisboa.

Como inverter esta tendência

São os salários demasiados baixos ou o custo da habitação é demasiado elevado?

Este assunto leva a uma questão para a qual temo não haver resposta: em que prato está a balança mais desiquilibrada? São os salários que são demasiado baixos ou os valores do imobiliário estão exageradamente elevados na cidade de Lisboa? Ora, é daquelas questões como “o que surgiu primeiro: o ovo ou galinha?”…

Efectivamente, Portugal tem salários baixos quando comparamos com a média dos países constantes no estudo. Todavia, em Lisboa os vencimentos são superiores à média nacional e é precisamente esta a cidade onde é mais caro viver. Tal leva-nos a apontar o dedo à especulação imobiliária, com a emergente necessidade de controlar os valores das transações imobiliárias.

Uma cidade para todos

Note-se que sou forte defensora da multiculturalidade e não defendo de todo uma cidade fechada à vinda de estrangeiros, pois sou da opinião que a sua presença nos enriquece. Contudo, o recebermos cidadãos de todo o mundo em Lisboa e proporcionarmos-lhe a possibilidade de aqui viverem não pode levar à expulsão de portugueses do centro. A cidade deve ser para todos e a palavra “todos” tem de incluir os portugueses.

A (inevitável) intervenção do Estado no custo da habitação

Num cenário em que os imóveis de Lisboa deixaram de ser financeiramente acessíveis aos portugueses, muitas são as vozes que apontam a necessidade de intervenção do Estado, nomeadamente com a criação de bolsas de arrendamento acessível. Note-se que os principais investidores não vêem com bons olhos esta intervenção do Estado, preferindo que seja o mercado livre e a lei da oferta-procura a ditar os preços.

Não devemos esquecer que a Constituição Portuguesa salvaguarda o direito à habitação e seria (no mínimo) estranho que esse direito excluísse a própria capital. Embora o investimento do Estado em frações residenciais para arrendamento possa significar um elevado esforço financeiro (pois para ter impacto teria de ter uma grande escala), sou da opinião que é um esforço necessário e indispensável. De outra forma, teremos um mercado imobiliário dominado por intenções especulativas, com muitos imóveis sem serem habitados ou a serem ocupados apenas esporadicamente, o que em nada contribui para o desenvolvimento da cidade e do país.

Pode ler o artigo completo em: https://www.idealista.pt/news/imobiliario/habitacao/2022/05/25/52434-lisboa-e-a-terceira-cidade-mais-cara-do-mundo-para-se-viver

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